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domingo, 2 de outubro de 2011

A polêmica do Direito Criminal

Permanecendo na questão da ética no Direito, reunimos dois textos interessantes sobre o assunto: o primeiro, uma notícia extraída do jornal O Estado de S. Paulo, traz uma resposta da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) à uma declaração polêmica de um advogado criminalista. O segundo é um artigo escrito justamente por um advogado criminalista, no qual apresenta as dificuldades do ofício, o preconceito sofrido por parte  da população e pelos próprios colegas e esclarece o real papel dos profissionais dessa área. Confira a seguir:

OAB repudia advogado da ''ética de bandido''

Jefferson Badan defende criminoso que participou de latrocínio na USP e, em entrevista anteontem, disse que quem é do crime não entrega parceiro

11 de junho de 2011 | 0h 00
William Cardoso - O Estado de S.Paulo

A declaração do advogado Jefferson Badan associando o crime a uma profissão e dizendo que todo bandido tem ética foi repudiada pela seção paulista da Ordem  dos Advogados do Brasil (OAB-SP). A afirmação de Badan foi feita anteontem,    em defesa de Irlan Graciano Santiago, de 22 anos, que participou em 18 de maio do assassinato do estudante Felipe Ramos de Paiva, de 24, no câmpus da Universidade de São Paulo (USP), no Butantã, zona oeste da capital.

Crime. Badan (à dir.), com seu cliente Irlan Santiago, que participou de latrocínio na USP - Tiago Queiroz/AE–9/6/2011
Crime. Badan (à dir.), com seu cliente Irlan Santiago, que participou de latrocínio na USP. Tiago Queiroz/AE-9/6/2011
Durante entrevista coletiva, o advogado foi questionado sobre o motivo pelo qual o cliente não contaria quem foi o comparsa na ação que matou o estudante. "Quem é do crime nunca entrega parceiro. Todo bandido tem ética. Você é um cara   experiente na área criminal e sei que está fazendo essa pergunta simplesmente por fazer, porque você sabe que todas as profissões têm ética. E, na sua profissão, se tiver um repórter na sua frente, a ética dele é dar espaço para você também trabalhar", afirmou Badan.
O presidente da OAB-SP, Luiz Flávio D"Urso, diz que a entidade repudia a afirmação do advogado, mas explica que não houve uma infração ao Código de Ética da própria categoria. "O  advogado, na hora em que está realizando a defesa, tem imunidade em relação às suas declarações. Elas não trazem a ele consequência direta. Agora, o repúdio cabe à Ordem fazer, porque foi algo que ultrapassou os limites de defesa do cliente e alcançou toda a nossa classe. Cria uma imagem negativa da advocacia para a população, algo irreal."
D"Urso afirma que na segunda-feira haverá uma reunião da diretoria da OAB     para definir se será o caso de tomar alguma outra providência em relação a Badan.
Confusão. Segundo o presidente da OAB-SP, Badan confundiu conceitos ao falar  sobre ética no crime. "É uma manifestação infeliz. A atividade criminosa não é profissão, é crime. É inadmissível estabelecer qualquer relação", afirma. D"Urso diz que Badan pode se retratar publicamente para superar o fato.
Mestre em Filosofia do Direito e professora de Ética da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Celeste Melão afirma que Badan não infringiu o estatuto da OAB, mas que deveria ser mais zeloso com as suas declarações. "A ética está acima da conduta, é a possibilidade de construir comportamentos que estruturem o bom, o belo e o justo. Não se pode falar disso em um ambiente de ilícitos. É, quando muito, um acordo para a sobrevivência."
Para o desembargador Antonio Carlos Malheiros, o advogado falhou. "Foi uma declaração equivocada. Não é ética coisa nenhuma. O que foi chamado de ética por ele é um código de conduta que rege a lei do silêncio."
O Estado tentou contato com Badan ontem, mas ele não respondeu até as 23 horas. Mesmo assumindo a participação no assassinato do estudante, o cliente de Badan foi liberado por ter se apresentado, não ter antecedentes criminais e possuir endereço fixo. Responderá em liberdade.


Criminalista não é criminoso
Tarefa de advogado criminalista é árdua e mal compreendida.

Em certa ocasião, o célebre jurista Waldir Troncoso Perez, considerado o "Príncipe dos Advogados", disse que, em tempos passados, o advogado criminalista enfrentava inúmeras dificuldades para exercer sua profissão com dignidade e respeito; mas, que, hoje, essas dificuldades são assustadoramen-te maiores ainda. Não há como não ratificar esse pensamento, já que o advogado criminalista enfrenta ainda a pior das dificuldades, que é o preconceito da sociedade e, mais grave ainda, a reprovação de  seus próprios colegas e das Entidades que, em princípio, deveriam defender suas prerrogativas.
É comum se ouvir, entre a população, que o advogado criminalista "defende bandido" e o coloca em liberdade. Evidentemente, um viés de opinião, já que o advogado criminalista, ao exercer suas prerrogativas de defensor e listar, entre seus clientes, pessoas que cometeram crimes graves, assassinos, seqüestradores e traficantes. Mas, mesmo sendo um réu confesso, a pessoa tem, garantido pela constituição, o direito à defesa. E, para que esse direito seja exercido, é preciso a presença de um advogado.
O Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil, a lei 8906/94, determina ser direito do advogado "assumir a defesa criminal, sem considerar sua própria opinião sobre a culpa do acusado". Dessa forma, o binômio "direito de defesa e defensor", torna-se indissociável.
O que não se pode confundir, no papel do advogado criminalista, é que o que se defende é a pessoa acusada, não o crime que cometeu. Todo crime deve ser punido pela lei e todo criminoso, se for considerado culpado em julgamento, deve ser privado da liberdade. É evidente que, ao exercer esse papel, o advogado criminalista deve utilizar-se de todos seus valores éticos, onde o limitador é a consciência de cada profissional. Mas em nenhum momento o criminalista pode ser taxado de cúmplice do bandido ou de buscar sempre sua absolvição. O que se defende é a pessoa, não a liberdade, não o criminoso.
A defesa deve sempre seguir a lei para conseguir seus objetivos, mantendo-se sempre dentro do que determina a ética e o código de deontologia. Onde a linha é tênue, entre o foro íntimo do advogado criminalista e o legítimo direito de defesa do acusado, é que dá margem para que o mau profissional extrapole suas prerrogativas e sua própria consciência, então cabem a crítica e a reparação, devendo as Entidades de classe, nesse caso, exercerem seu papel fiscalizador e punitivo.
Mas, em nenhum momento, o advogado criminalista deve ser criticado, condenado ou punido por estar defendendo um criminoso, mesmo que um bandido sanguinolento e réu confesso.
O advogado criminalista não desenvolve seu trabalho visando simplesmente colocar o acusado em liberdade, mas buscando, nos próprios Códigos Penal e de Processo Penal, o que melhor se adequar ao caso, assegurando a defesa do contraditório. Sua tarefa é árdua, mal compreendida, alvo de censura e mesmo escárnio dos colegas, mas há que se considerar, sobretudo, a exigibilidade da defesa criminal como garantia do contraditório.
O direito à defesa face à Constituição Federal é sagrado, e nisso reside a maior responsabilidade no trabalho do Advogado Criminalista. E sem o advogado, jamais poderá haver Justiça.

DIAS, Ailton Henrique. Criminalista não é criminoso. Disponível em:
http://www.webartigos.com/artigos/criminalista-nao-e-criminoso/14760/ 
Acesso em: 02 outubro 2011.

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